top of page
  • Foto do escritorRepórterVoluntário

Gastronomia coreana que faz os portugueses sentirem-se em casa


Certamente não serei a primeira a dizê-lo, e os seguidores que não residem no país de origem com certeza concordarão que, de vez em quando, bate uma saudade enorme da "nossa comida”.


Um ano e meio depois de ter vindo para a Coreia, muitos talvez pensem que é pouco tempo, e principalmente com o isolamento causado pela pandemia, tem sido mais comum sentir saudades de comer comida portuguesa. Uma francesinha, uma posta de bacalhau (de qualquer maneira), uma feijoada, um cozido, ou o simples pão ou bolos acessíveis em qualquer café, para não referir as doçarias natalícias.

Não me posso queixar verdade, pois sou muito feliz na Coreia do Sul. Como muito bem. Às vezes até mais do que devia. Mas a minha costela portuguesa não me permite esquecer os nossos sabores! E isso faz com que, de vez em quando, encontre semelhanças em pratos coreanos e portugueses, ou alguns cheiros nas ruas ou supermercados/zonas de restauração me lembrem das minhas origens.


O primeiro prato é o churrasco. Sim, o churrasco deles é muito diferente. Sim, o modo como eles preparam a carne e confecionam na mesa é diferente. Mas já há mais restaurantes a servirem o entrecosto (menos espesso do que aquele para grelhar na mesa) à nossa maneira. Mas neste ponto quero falar do frango de churrasco. Eu que sonhava com o frango de churrasco dos hipermercados, encontrei em Daejeon um restaurante com mais de 30 anos de história que grelha os frangos como os portugueses. O frango aberto sobre a grelha, como se vê nas festas populares ou em restaurantes. Quando passei pelo restaurante e vi a vitrina com o homem a grelhar os frangos e senti o cheiro dos grelhados, por milésimos de segundo senti que estava em Portugal.



Legenda: Frango de churrasco, metade picante e metade sem picante

(o pacotinho de papel de alumínio contém sal, visto que os coreanos não temperam a carne para grelhar como nós).



Quem já ouviu falar de “전 Jeon”? Jeon pode ser a palavra para referir aquelas panquecas maiores com legumes, marisco, kimchi e/ou carne, ou então para se referir a miniaturas fritas que são nacional e tradicionalmente consumidas nos festivas de outono e primavera. Se pensarmos na versão portuguesa seriam os filetes de peixe, pataniscas e legumes panados. De todos eles, o mais parecido é mesmo o filete de peixe. É confecionado exatamente da mesma maneira que a minha família confeciona. A primeira vez que provei esta iguaria, sim, acho que verti uma lágrima.



Legenda: O set conta com os filetes de peixe (à esquerda), “pataniscas” de carne (em baixo), delícias do mar panadas, curgete, cogumelo e pimentos recheados panados. Jeon é a comida eleita dos coreanos em dias chuvosos, acompanhada pelo vinho de arroz (막걸리makgeolli), já que o som da fritura relembra o som da chuva.



Talvez o próximo prato gere alguma controvérsia. Na minha terra, quando falamos em bifana, referimo-nos a uma ou duas fêveras de porco cozinhadas em molho de tomate picante e servidas no pão. Noutras regiões do país já consumi também bifana, mas tratava-se apenas de uma ou duas fêveras grelhadas e servidas no pão. Neste caso, o prato coreano que se segue é parecido com a primeira versão de bifanas mencionada. Em coreano, refiro-me ao “김치찜 kimchi jjim”. Mas, antes de pensarem “não usamos kimchi na culinária portuguesa”, quero só referir que quando consumi a versão caseira pela primeira vez, a quantidade de kimchi era quase imperceptível, tornando aquela versão do prato a mais próxima das bifanas (foto 1). Este prato não é, no entanto, confecionado com molho de tomate. Mas o sabor é bastante aproximado às bifanas que preparamos quando fazemos festas lá em casa.



Legenda - Foto Esquerda: A foto não é da melhor qualidade pois estava demasiado feliz. Não só por estar a comer “bifanas” mas por estar a comer com pão a sério e poder, no fim, molhar o pão no molho restante. Sim, sou bastante portuguesa.

Legenda - Foto Direita: A versão “normal” do kimchi jjim. A quantidade de kimchi utilizada na confeção aproxima ou afasta o prato da versão portuguesa das bifanas.



Das primeiras vezes que o meu namorado cozinhou para mim, decidiu preparar um prato que eu nunca tinha provado antes, “닭도리탕dakdoritang”. Como muito facilmente irão perceber pela foto, é um guisado de frango com batata e cenoura. Há quem diga que os homens se conquistam pelo estômago, mas desta vez fui eu que fui conquistada. Senti-me em casa! Não preciso de dizer muito sobre este prato, uma pesquisa rápida na internet mostrará fotografias que falam por si. Este prato também não é confecionado com molho de tomate, no entanto os restantes sabores estão presentes.



Legenda: Imagem de pesquisa



Há uns dias atrás, enquanto estudava para um exame, mais uma vez fui surpreendida com um aroma familiar. Na cozinha, o chefe da casa preparava “갈비찜 galbi jjim”, mais um prato que ainda não tinha provado. Um estufado de carne de vaca (neste caso, costelas) com legumes, que podem variar. Apesar de a versão coreana ser um pouco diferente, pela presença de molho de soja, e em algumas regiões um pouco mais adocicada, o aspecto visual relembrou-me a comida da minha mãe. Confesso que de todos os pratos que referi este era o menos parecido em questão de sabor, pois em Daejeon a versão tende a ser mais adocicada. Mas fez-me ligar à minha mãe para lhe mostrar o que estava a comer, que mesmo longe, há comidas que me fazem pensar em casa.



Legenda: A versão portuguesa não contém gochu (pimento picante) ou cogumelos.



E, quando aperta muito a saudade e o tempo escasseia, em Seoul existe uma cadeia que vende o pastel de nata mais próximo ao português que já provei no estrangeiro. A marca “Nata o bica” tem já vários pontos de venda espalhados pela capital, após ter sido criada por um chefe coreano que aprendeu os segredos desta iguaria em Portugal. Acompanhado de um bom café, à moda portuguesa (o expresso, não o “americano”), é sempre um bom regresso a casa sem sair da Coreia.





Claro que, bom português, sabe “desenrascar”. Quando a saudade aperta, ponho mãos à obra. Como o meu tempo não abunda, e sou mais dotada para a doçaria, os meus pastéis de nata já fizeram furor na China e fazem também furor na Coreia do Sul. Além disso, depois de assistir ao programa “Salty Tour” em Lisboa, o meu namorado ficou muito curioso como o “pica-pau” e acabei por lhe fazer a vontade. A terceira vaga está a confinar de novo a Coreia, e com a proximidade do Natal, tenho sentido mais vontade de cozinhar comida portuguesa. Contudo, cozinhar na Coreia pode ser mais dispendioso do que comer fora, e a gastronomia portuguesa requer a utilização de mais carne ou legumes mais caros, enquanto o mercado está mais adaptado à cozinha coreana e às necessidades dos coreanos.



Legenda: Húngaras (ou Húngaros), as minhas bolachas favoritas e a arma perfeita para conquistar a família do meu namorado.



Talvez seja só eu que estou com muitas saudades de comer comida portuguesa a sério. Desde 2013 que ando entre China, Portugal, Coreia do Sul, passando muito mais tempo fora do que no meu país.

Às vezes acho que já me esqueci dos sabores, dos cheiros. Mas ainda hoje, quando entrei num supermercado, estavam a preparar algo com canela, e pensei “cheira a Natal”. Afinal não me esqueci. Ainda sou bem portuguesa. Mas a minha aventura gastronómica pela Coreia do Sul está longe de terminar, e até lá vou-me sentindo aconchegada nestas pequenas semelhanças.



Artigo escrito por: Andreia Carvalho

296 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page