top of page
  • Foto do escritorRepórterVoluntário

CÁ E LÁ: EXPERIÊNCIAS DE ESTUDO NA COREIA DO SUL E EM PORTUGAL - Parte II

Uma experiência atribulada na Coreia do Sul


Estudar na Coreia do Sul talvez seja, para muitos dos seguidores desta página, um sonho ou uma meta. Não quero, de todo, que este artigo vos desanime. Mas a realidade nem sempre é o mar de rosas que vemos nos dramas coreanos. Felizmente, não é o pesadelo que imaginaram com a afirmação anterior.


A minha experiência de estudo na Coreia do Sul tem duas variantes. A primeira, estudar na Coreia como estudante de língua coreana, e a segunda, como estudante de doutoramento.

Em 2019 mudei-me para a Coreia do Sul com o objetivo de estudar a língua coreana. Era um sonho desde 2010 e finalmente tinha reunido as condições necessárias para tal. Concorri ao curso de língua numa universidade em Seoul, fui aceite, fiz as malas e vim. Não era a minha primeira vez a estudar ou viver no estrangeiro, por isso foi uma adaptação pacífica. Mas, nem sempre foi fácil. Há sempre algum choque cultural, por muito que se conheça a cultura.


Os primeiros seis meses em que estudei apenas coreano foram, desde que me mudei para a Coreia, o período mais relaxante e enriquecedor a nível de experiências. Apesar de estar a custear toda a minha estadia, e não poder gastar tanto quanto queria, tinha tempo para explorar e viajar, e curiosidade para tal. Fiz muitos amigos estrangeiros no instituto onde estudei, mas poucos amigos coreanos fiz. Não é fácil fazer amigos coreanos no campus da universidade (e muito menos naquela universidade, onde todos os estudantes são super ocupados e estudiosos).


Quando estava preparada para financiar mais seis meses do curso, recebi a notícia. Aquando da vinda para a Coreia, concorri também à bolsa de estudos do governo coreano, que oferece uma bolsa de mestrado ou doutoramento a Portugal. E consegui! Quase não queria acreditar. Fiquei super feliz! Mas… não imaginava o que me esperava.


Com esta bolsa, se for aceite por uma universidade em Seoul, o aluno terá que fazer o programa de aprendizagem de língua (um ano) fora da capital. E eu, com a minha sorte, fui enviada para Nonsan. Provavelmente nunca ouviram falar. É uma pequena cidade que pouco mais tem do que a principal base militar e quintas produtoras de morangos. Talvez continuem sem saber, mas não se preocupem, muitos coreanos também não conhecem. E, num local tão recôndito, a minha vida, cheia de experiências e liberdade em Seoul, tornou-se muito mais calma e apagada.



Estudar com bolsa é uma oportunidade fantástica, mas tal implica atingir certos resultados. A pressão de conseguir passar um certo nível do TOPIK (exame de coreano) pode, em alguns casos, influenciar o interesse e motivação para estudar a língua. A universidade onde fui colocada tinha um método de ensino mais focado na passagem do exame, sem preparar os alunos para falar em coreano em aulas de mestrado/doutoramento, tornando a experiência de aprendizagem da língua em algo mecanizado e frustrante. Mesmo numa universidade pequena, no meio do nada, continuou a ser difícil interagir com alunos coreanos, e nem o programa de “language buddy” ajudou a fazer amigos locais.


Felizmente, no fim do mundo que é Nonsan, conheci também as melhores pessoas e aprendi mais sobre a cultura coreana. O meu nível de coreano não melhorou tanto quanto eu queria mas, por acidente, passei o TOPIK 5 seis meses mais cedo que o previsto e fui transferida para Seoul. Digo “por acidente” pois não tencionava passar o exame tão cedo já que, alunos com nível 5 ou 6 são obrigados a iniciar o mestrado ou doutoramento. O meu stress começou aí.


Infelizmente, todos estes acontecimentos repentinos e inesperados coincidiram com o início da primeira vaga da pandemia. A felicidade de voltar para Seoul foi rapidamente engolida pelo distaciamento social. Ou seja, comecei um doutoramento sem ir à universidade, com aulas online, sem receção aos novos alunos, clubes ou actividades.



Estudar numa universidade no estrangeiro é, em parte, uma experiência partilhada com estudantes locais e estrangeiros, onde trocamos experiências e aprendemos através de outros pontos de vista. E assim, o meu primeiro ano de doutoramento foi reduzido a um ecrã com vários rostos desconhecidos, sem grandes oportunidades de interação, com aulas completamente em coreano. Não fiz amigos, não conheço a maioria dos meus colegas. Sinto que não aprendi tanto quanto poderia. Mas sei que não poderia ser de outra maneira, nem prevejo que a situação mude até que a pandemia esteja controlada e apopulação vacinada.


A pandemia trouxe ainda outro agravante, a ansiedade. Não fui a única afetada, claro. Mas a constante sensação de não ter conhecimento suficiente da língua (para entender e participar nas aulas, e exames), a falta de contacto e interação com colegas e professores e a incerteza de quando tudo voltará à normalidade influenciaram o meu estado de espírito ao longo deste ano. Aprendi muito, mas não fiz tanto quanto gostaria (viajar, experiências, estudar…). Apesar de todo o meu queixume, a Coreia não “fechou completamente”, e mesmo com todo o condicionamento, ainda deu para comer fora, ir ao cinema, e dar alguns passeios.


Estes dois anos na Coreia do Sul ajudaram-me a crescer muito. A vida aqui é muito acelerada, de repente acontecem mil e uma coisas, o tempo passa a correr. São dois anos aqui e parece ter sido apenas um. Aprendi mais sobre a língua, a cultura, a gastronomia e mais sobre a educação e a sociedade coreana. Aprendi muito mais como pessoa, cresci. E, apesar de todos os dias cinzentos ou do stress causado pelos estudos, dou por mim a caminhar na rua e a pensar “eu estou na Coreia”. Porque, às vezes, nem eu mesma acredito. Valeu a espera, o investimento, o stress. E, assim que a pandemia acalmar, vou explorar tudo o que deixei na lista de espera.



Se querem mesmo estudar na Coreia do Sul, não desistam de tentar. Pode demorar a juntar o dinheiro necessário, pode demorar tempo até surgir a oportunidade. Tudo vem a seu tempo, não desesperem. E, chegar à Coreia, não significa que a vida será um Kdrama. Sim, já vivi muitos momentos dignos de um drama, e haverá memórias incríveis para recordar para sempre. Mas vão sempre haver dias em que vão questionar a vossa decisão e o porquê de estarem onde estão, dias em que não parece fazer sentido estar cá. Nos dias em que me sinto mais em baixo penso nos anos em que só ouvia kpop e via séries coreanas, e em como queria estar onde estou. E isso faz-me perceber que, até os dias maus valem a pena, pois estou onde sempre quis estar.




Artigo e fotos por : Andreia Carvalho

146 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page