2020 está a ser marcado por uma série de acontecimentos nunca antes vivenciados. O mundo continua a girar, mas nem todos os países lidaram com a situação da mesma forma.
A pandemia, que teve início na China, causa ainda imensas vítimas diariamente. Mas, como está a Coreia do Sul a lidar com a situação? O que foi feito para impedir que o vírus dispersasse por todo o país?
A viver na Coreia desde o ano passado, como estudante, fui uma dos muitos alunos que decidiu não voltar a casa aquando da explosão de casos de covid-19. Muitos alunos acharam mais seguro regressar e autorizações especiais foram concedidas aos alunos bolseiros. Mas tal como eu, muitos consideraram mais seguro ficar.
Desinfeção de mercado, em Daegu
O pico começou pouco depois do início das férias de inverno. As viagens e planos tiveram de ser alterados, não porque o país foi “confinado”, mas porque a consciência falou mais alto. O governo não decretou o confinamento obrigatório por causa da pandemia. As escolas, museus, bibliotecas e locais de interesse público foram fechados. Mas tudo o resto funcionou com a devida normalidade.
Museu encerrado após início da pandemia, em Namwon
A Coreia adotou o método TRUST (confiança, em português), cujas iniciais em inglês significam transparência, responsabilidade, ações conjuntas, ciência e rapidez, e juntos em solidariedade.
O método funcionou da seguinte forma:
- Assim que os primeiros casos surgiram, o rastreio rigoroso dos contactos dos pacientes e suspeitos, permitiu uma rápida ação e evitou uma maior propagação do vírus. Para além disso o governo enviou, e envia, mensagens atempadamente informando onde os pacientes estiveram, de forma que pessoas que estiveram no mesmo local se sujeitem a testes e evitem a propagação. Estas duas medidas fazem parte da transparência.
- Com responsabilidade, o governo não obrigou ao confinamento, mas confiou que as pessoas seriam responsáveis para cumprir o distanciamento social e as medidas sanitárias. Além disso, o governo distribuiu subsídios de apoio e permitiu testes gratuitos a casos suspeitos.
- As ações conjuntas referem-se ao trabalho desenvolvido pelo governo, instituições de investigação e empresas que permitiram um desenvolvimento mais rápido de kits de teste.
- E, como país inovador, a ciência avançada permitiu uma resposta rápida. Os testes em massa, com resultados rápidos, foram uma das várias medidas aplaudidas internacionalmente.
- Por fim, a Coreia do Sul não só lidou bem com a situação, como se ofereceu para ajudar outros países que mais tarde foram afetados pelo vírus.
O governo, que quis evitar o mesmo erro de 2015 com o MERS, tendo sido mais rápido e bem-sucedido nas suas medidas. A atitude do povo coreano foi também importante nesta luta. Sem pensar no “próprio umbigo”, e com noção das consequências económicas da pandemia, os coreanos adotaram rapidamente o distanciamento social, o que permitiu um controlo mais rápido. Deste modo, segundo os dados da OCDE, a Coreia do Sul será o país menos afetado economicamente pelo Covid-19.
Além disso, o governo responsabilizou-se por todos os estrangeiros que legal ou ilegalmente se encontravam no território. O inicial rácio de máscaras foi apenas criado para os coreanos, mas rapidamente foi expandido aos estrangeiros, para além de máscaras de algodão com filtros, oferecidas pelo governo nas ruas de Seoul. O uso generalizado de máscaras foi aconselhado, e apesar de inicialmente os números de máscaras disponíveis ter diminuído, os stocks foram rapidamente repostos e o rácio de vendas foi estabelecido.
Medidas preventivas foram ainda criadas para os viajantes. Todos os que chegam de viagem devem fazer quarentena obrigatória num edifício definido pelo governo ou em casa/dormitório. Os estrangeiros com visto de residente, para além de precisarem de autorização para entrar de novo na Coreia (antes de partir), devem agora entregar um documento médico onde esteja escrito que o viajante não tem nenhum dos sintomas associados ao vírus (documento deve ser passado até 48h antes do voo de regresso). Estas medidas foram alteradas a 1 de junho, antes de a segunda vaga começar.
Negócios a funcionar normalmente, mas ruas vazias, em Yeosu.
Apesar de ter ficado um pouco assustada com o a situação inicial, ter ficado na Coreia do Sul foi a melhor opção. Para além de a situação ter sido bem resolvida pelo governo, a atitude da população surpreendeu-me bastante. Claro que existem exceções, mas ver um povo unido a esforçar-se para que a pandemia não dure tanto como noutros países é algo raro. Claro que não é tudo um mar de rosas, a segunda vaga está a acontecer agora, mas ações estão a ser tomadas e a vida corre com relativa normalidade. As aulas são lecionadas online, museus e bibliotecas continuam encerrados, mas tudo o resto funciona normalmente com alguns cuidados.
Viver na Coreia do Sul nesta fase de pandemia foi uma descoberta dos valores deste país, e fortaleceu ainda mais o respeito e interesse que tenho por esta nação.
Artigo e Fotografias por: Andreia Carvalho
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